Gol anuncia saída da Bolsa: o que o investidor deve fazer?
Por Maurício Takahashi, professor do curso Administração da Universidade Presbiteriana Mackenzie, campus Alphaville
A companhia GOL Linhas Aéreas Inteligentes S.A. (ações negociadas sob os códigos GOLL3 e GOLL4 na B3 – Brasil, Bolsa, Balcão) deu mais um passo decisivo em seu processo de reorganização societária ao anunciar uma proposta de incorporação e fechamento de capital, medida que levará à sua saída da Bolsa brasileira.
O movimento marca uma nova fase para a empresa, mas também acende um alerta para os investidores — especialmente aqueles com visão de médio e longo prazo e foco em independência financeira. Trata-se de um evento que combina riscos e oportunidades, exigindo decisões estratégicas e rápidas.
Para quem já possui ações da GOL, o momento pede cautela e pragmatismo. A iminente deslistagem tende a reduzir drasticamente a liquidez dos papéis, tornando mais difícil vendê-los no futuro. Diante disso, pode ser sensato considerar a venda enquanto ainda há algum volume de negociação e o preço de mercado reflete, ao menos parcialmente, o risco envolvido. Também é essencial acompanhar de perto o anúncio da oferta pública de aquisição (OPA), os detalhes sobre preço, prazo e condições definirão se haverá espaço para uma saída financeiramente vantajosa.
Manter o investimento exige uma reflexão cuidadosa sobre o custo de oportunidade (potenciais ganhos em outros papéis de riscos semelhantes). Permanecer em um ativo prestes a se tornar ilíquido pode significar abrir mão de retornos mais previsíveis em alternativas menos arriscadas. Para quem busca segurança, transparência e liberdade para rebalancear a carteira, a exposição a um papel de risco elevado e baixa visibilidade futura talvez não seja a melhor opção. Rever o peso da GOL na carteira e garantir que a posição não ultrapasse o próprio limite de tolerância ao risco é uma decisão prudente neste cenário.
Já quem cogitava entrar agora deve, simplesmente, evitar. Comprar ações de uma empresa às vésperas de deixar a Bolsa contraria os princípios básicos de liquidez e previsibilidade que sustentam uma estratégia de investimento sólida. Se o objetivo for manter alguma exposição ao setor aéreo, há alternativas mais consistentes: aguardar um eventual futuro IPO da companhia, observar outras empresas do segmento com fundamentos mais saudáveis ou optar por fundos que ofereçam diversificação e liquidez. Em tempos de incerteza, previsibilidade e disciplina continuam sendo as melhores aliadas do investidor consciente.
Futuro da Gol: de que forma a reorganização societária pode ser feita após desistência de fusão com a Azul?
Medida também ocorre em um momento de ajustes estratégicos do Abra Group, holding que controla a companhia aérea.
Após o fim das negociações de fusão com a Azul, a Gol Linhas Aéreas planeja uma reorganização societária que pode incluir o fechamento de capital no Brasil. O movimento marca uma nova fase para a companhia, que busca reestruturar sua governança e reduzir custos em meio ao processo de recuperação judicial nos Estados Unidos. A medida também ocorre em um momento de ajustes estratégicos do Abra Group, holding que controla tanto a Gol quanto a Avianca, e que tem sinalizado interesse em unificar operações e simplificar estruturas.
De acordo com Fernando Canutto, sócio do Godke Advogados e especialista em Direito Societário, a reorganização societária da Gol pode ser estruturada de forma a reduzir custos, simplificar a governança e preparar o terreno para novas negociações no setor aéreo.
“A companhia pode adotar mecanismos como a incorporação pela holding Abra Group, a realização de cisões parciais para separar ativos estratégicos ou a reorganização das classes de ações. Essas medidas permitem centralizar a gestão, eliminar sobreposição de estruturas e tornar a empresa mais ágil na tomada de decisões, além de reduzir gastos relacionados a governança corporativa no Brasil”. A estratégia, segundo o especialista, também pode incluir o fechamento de capital, com consequente diminuição das obrigações regulatórias e de compliance, deixando a companhia mais leve e flexível para explorar futuras alianças ou fusões.
O equilíbrio entre controladores e acionistas minoritários exige que a Gol adote mecanismos de proteção, previstos na legislação societária e regulatória. Nesse contexto, a companhia deverá realizar uma Oferta Pública de Aquisição (OPA) para a saída do mercado, garantindo que os minoritários possam vender suas ações por um preço justo, determinado por laudo de avaliação independente. Além disso, a empresa deve assegurar ampla transparência, divulgando os termos da operação em fatos relevantes e relatórios acessíveis.
“Dependendo da estrutura da reorganização, também podem surgir direitos de recesso, permitindo que os acionistas dissidentes sejam indenizados. Essas práticas evitam abusos do poder de controle e asseguram tratamento equitativo a todos os investidores, preservando a credibilidade da operação”, avalia Canutto.
Squeeze out: solução para compra de ações
No contexto da possível reorganização societária da GOL, com a saída da companhia do mercado de capitais brasileiro, é juridicamente viável cogitar a utilização do mecanismo conhecido como squeeze out, ou seja, a aquisição compulsória das ações remanescentes dos acionistas minoritários pelo acionista controlador, com o objetivo de consolidar 100% da estrutura acionária da empresa.
Embora o termo squeeze out não esteja expressamente previsto na legislação brasileira, ele é operacionalizado, na prática, por meio da realização de uma OPA para fechamento de capital, conforme previsto na Lei das S.A. (Lei nº 6.404/76) e na Instrução CVM nº 85/22 , especialmente quando o controlador atinge 95% ou mais das ações em circulação no mercado.
“No caso da GOL, como o grupo controlador possui mais de 95% das ações em circulação, poderá realizar o squeeze out, adquirindo compulsoriamente as ações remanescentes dos minoritários que não alienaram suas ações na OPA, mediante o pagamento do mesmo valor da oferta, desde que validado por laudo de avaliação independente que ateste o preço justo”, explica o advogado.
Impactos da reorganização societária para a Gol
Os impactos de uma reorganização societária desse porte são amplos. Para os credores, a mudança pode afetar diretamente a forma de pagamento das dívidas em curso, especialmente porque a Gol está em recuperação judicial nos Estados Unidos e qualquer alteração societária precisará se alinhar ao plano aprovado. Para os investidores, o fechamento de capital pode trazer ganhos ou perdas dependendo do valor atribuído às ações na OPA, mas é essencial que o processo seja transparente e garanta o tratamento justo. Já para a concessionária de aeroportos, fornecedores e funcionários, a reorganização pode representar ajustes nos contratos, revisão de condições operacionais e até mudanças na governança trabalhista. “Do ponto de vista do mercado, a operação pode influenciar a confiança dos investidores no setor aéreo, exigindo comunicação clara e eficaz para preservar a credibilidade da Gol e do Abra Group, além de minimizar riscos de instabilidade no setor”, conclui Canutto.
Fonte:
Fernando Canutto - sócio do Godke Advogados. Especialista em Planejamento Estratégico Empresarial, Direito Societário, Governança Corporativa, Compliance e Investimento Estrangeiro.